Orientações e medidas alternativas para aplicação em estado de calamidade pública

1. COMO DEVEM SER TRATADAS AS FALTAS AO TRABALHO DECORRENTES DO ESTADO DE CALAMIDADE DECORRENTE DAS ENCHENTES NO RIO GRANDE DO SUL?

A CLT, em seu artigo 473, elenca as circunstâncias em que o empregado pode faltar ao trabalho sem prejuízo salarial, como falecimento do cônjuge, casamento, nascimento de filho, doação de sangue, entre outros. No entanto, não menciona explicitamente as enchentes ou qualquer outro desastre natural como uma dessas situações.

Desta forma, sem uma previsão legal para afastamento remunerado, legalmente o trabalhador pode ter seus dias de falta por enchente descontados do salário. Contudo, é importante entender que se trata de uma “falta justificada”, ou seja, só pode ser descontado o dia efetivo de falta, sem desconto do DSR ou qualquer outra sanção decorrente disso.

Essa justificativa se dá mediante atestado, fornecido pela própria prefeitura local.

O atestado calamidade abrange aqueles empregados afetados pelas enchentes. Em Porto Alegre, por exemplo, o Decreto nº 22.647, emitido em 2 de maio de 2024 prevê que os atestados têm validade a partir do dia 29 de abril e continuará nos dias subsequentes, enquanto perdurar o estado de calamidade, a fim de oferecer suporte aos residentes afetados. É importante analisar, portanto, os atos normativos de cada cidade em relação a esta situação. O atestado é vinculado ao CEP do solicitante e inclui informações de mobilidade para aqueles que não conseguem trabalhar. O documento possui autenticação on-line, garantindo sua validade e segurança.

Também é importante esclarecer que um acordo ou convenção coletiva de trabalho pode estabelecer o abono das faltas em tais situações, ou mesmo compensações desses dias por banco de horas. Então é importante ficar atento às negociações envolvendo o sindicato correspondente.

É importante destacar mais uma vez que, embora o dia possa ser descontado, o trabalhador não pode sofrer punições como advertência, suspensão ou demissão por justa causa por esse motivo.

Cabe ressaltar que, apesar das disposições legais referentes ao caso, sempre é importante tratar o caso com o zelo adequado pois se tratam, na maioria dos casos, de pessoas atingidas diretamente pela catástrofe, então é prudente considerar o abono ou compensação como possibilidade nesse caso, até porque essa situação pode envolver risco de nulidade desses descontos em eventuais ações futuras pelo mesmo motivo.

2. CONSIDERANDO O ESTADO DE CALAMIDADE ATUAL DO RIO GRANDE DO SUL EM RAZÃO DAS ENCHENTES EXISTEM ALTERNATIVAS PARA FLEXIBILIZAR AS RELAÇÕES DE TRABALHO?

Sim, a lei 14.437/2022 autoriza o Poder Executivo federal a dispor sobre a adoção, por empregados e empregadores, de medidas trabalhistas alternativas e sobre o Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda, para enfrentamento das consequências sociais e econômicas de estado de calamidade pública em âmbito nacional ou em âmbito estadual, distrital ou municipal quando reconhecido pelo Poder Executivo federal.

Essas medidas têm sido utilizadas como base inclusive para firmar acordos e convenções coletivas de alguns sindicatos nesse período, como os comerciários em Porto Alegre. Importante destacar que as medidas aqui elencadas só podem ser aplicadas com o reconhecimento do poder executivo federal acerca das condições mencionadas e de ato do Ministério do Trabalho e Previdência, o que estimamos que deve ocorrer logo, ou ainda por negociação com os respectivos sindicatos.

Ainda, as medidas têm como destinatários os trabalhadores em grupos de risco e aqueles que atuam e residem em áreas específicas, atingidas por estado de calamidade pública. Na mesma toada, a Procuradoria Regional do Trabalho da 4ª Região, pelo Grupo de Trabalho Regional – Desastre Climático no RS, instituído pela Portaria 148.2024, editou a Recomendação nº 02/2024 (GT Desastre Climático), reiterou a possibilidade de aplicação da Lei.

A) QUAIS SÃO AS MEDIDAS PREVISTAS NA LEI 14.437/2022?

  1. Teletrabalho
  2. Antecipação de férias individuais
  3. Concessão de férias coletivas
  4. Aproveitamento e antecipação de feriados
  5. Banco de horas
  6. Suspensão da exigibilidade dos recolhimentos do fundo de garantia do tempo de serviço (FGTS)

1. Teletrabalho

O empregador poderá alterar o regime de trabalho presencial para teletrabalho ou trabalho remoto, além de determinar o retorno ao regime de trabalho presencial, dispensado o registro prévio da alteração no contrato individual de trabalho. Essa alteração depende de aviso prévio de 48 horas.

• As disposições relativas à responsabilidade pela aquisição, pela manutenção ou pelo fornecimento dos equipamentos tecnológicos e da infraestrutura necessária e adequada à prestação de teletrabalho ou de trabalho remoto e as disposições relativas ao reembolso de despesas efetuadas pelo empregado serão previstas em contrato escrito, firmado previamente ou no prazo de 30 (trinta) dias, contado da data da mudança do regime de trabalho.

• Na hipótese de o empregado não possuir os equipamentos tecnológicos ou a infraestrutura necessária e adequada à prestação de teletrabalho ou de trabalho remoto: » O empregador poderá fornecer os equipamentos em regime de comodato e custear os serviços de infraestrutura, que não caracterizarão verba de natureza salarial; ou » O período da jornada normal de trabalho será computado como tempo de trabalho à disposição do empregador, na impossibilidade do oferecimento do regime de comodato.

• Fica permitida a adoção do regime de teletrabalho ou de trabalho remoto para estagiários e aprendizes. Importante destacar que essa medida, assim como as demais, só pode ser aplicada com o reconhecimento do poder executivo federal acerca das condições mencionadas e de ato do Ministério do Trabalho e Previdência, ou então por negociação coletiva.

2. Antecipação de Férias Individuais

O empregador informará ao empregado sobre a antecipação de suas férias com antecedência de, no mínimo, 48 (quarenta e oito) horas, por escrito ou por meio eletrônico, com a indicação do período a ser gozado pelo empregado.

• As férias antecipadas:

» Não poderão ser gozadas em períodos inferiores a 5 (cinco) dias corridos.

» Poderão ser concedidas por ato do empregador, ainda que o período aquisitivo a que se referem não tenha transcorrido.

• O empregado e o empregador poderão, adicionalmente, negociar a antecipação de períodos futuros de férias, por meio de acordo individual escrito.

• Os pagamentos são regidos da seguinte forma:

» O adicional de 1/3 (um terço) relativo às férias concedidas poderá ser pago após a sua concessão, a critério do empregador, até a data em que é devida a gratificação natalina.

» Eventual abono de 1/3 dependerá da anuência do empregador, hipótese em que o pagamento poderá ser efetuado na mesma data acima.

» O pagamento da remuneração das férias concedidas poderá ser efetuado até o quinto dia útil do mês subsequente ao do início do gozo das férias.

Importante destacar que essa medida, assim como as demais, só pode ser aplicada com o reconhecimento do poder executivo federal acerca das condições mencionadas e de ato do Ministério do Trabalho e Previdência, ou então por negociação coletiva.

3. Antecipação de férias coletivas

O empregador poderá, a seu critério, conceder férias coletivas a todos os empregados ou a setores da empresa e deverá notificar o conjunto de empregados afetados, por escrito ou por meio eletrônico, com antecedência de, no mínimo, 48 (quarenta e oito) horas, hipótese em que não se aplicam o limite máximo de períodos anuais e o limite mínimo de dias corridos previstos na Consolidação das Leis do Trabalho.

• É permitida a concessão por prazo superior a 30 (trinta) dias.

• Aplica-se às férias coletivas mesmo em relação às férias individuais.

Importante destacar que essa medida, assim como as demais, só pode ser aplicada com o reconhecimento do poder executivo federal acerca das condições mencionadas e de ato do Ministério do Trabalho e Previdência, ou então por negociação coletiva.

4. Aproveitamento e antecipação de feriados

Os empregadores poderão antecipar o gozo de feriados federais, estaduais, distritais e municipais, incluídos os religiosos, e deverão notificar, por escrito ou por meio eletrônico, o conjunto de empregados beneficiados, com antecedência de, no mínimo, 48 (quarenta e oito) horas, com a indicação expressa dos feriados aproveitados.

• Os feriados poderão ser utilizados para compensação do saldo em banco de horas.

Importante destacar que essa medida, assim como as demais, só pode ser aplicada com o reconhecimento do poder executivo federal acerca das condições mencionadas e de ato do Ministério do Trabalho e Previdência, ou então por negociação coletiva.

5. Banco de Horas

Ficam autorizadas a interrupção das atividades pelo empregador e a constituição de regime especial de compensação de jornada, por meio de banco de horas, em favor do empregador ou do empregado.

• Deve ser estabelecido por meio de acordo individual ou coletivo escrito, para a compensação no prazo de até 18 (dezoito) meses, contado da data de encerramento do período estabelecido no ato do Ministério do Trabalho e Previdência que regulamentar a questão ou a negociação coletiva estabelecer.

• A compensação de tempo para recuperação do período interrompido poderá ser feita por meio da prorrogação de jornada em até 2 (duas) horas, a qual não poderá exceder 10 (dez) horas diárias e poderá ser realizada aos finais de semana.

• As empresas que desempenham atividades essenciais poderão constituir regime especial de compensação de jornada por meio de banco de horas independentemente da interrupção de suas atividades.

Importante destacar que essa medida, assim como as demais, só pode ser aplicada com o reconhecimento do poder executivo federal acerca das condições mencionadas e de ato do Ministério do Trabalho e Previdência, ou então por negociação coletiva.

6. Suspensão da exigibilidade do FGTS

Ficam autorizadas a interrupção das atividades pelo empregador e a constituição de regime especial de compensação de jornada, por meio de banco de horas, em favor do empregador ou do empregado.

• Deve ser estabelecido por meio de acordo individual ou coletivo escrito, para a compensação no prazo de até 18 (dezoito) meses, contado da data de encerramento do período estabelecido no ato do Ministério do Trabalho e Previdência que regulamentar a questão ou a negociação coletiva estabelecer.

• A compensação de tempo para recuperação do período interrompido poderá ser feita por meio da prorrogação de jornada em até 2 (duas) horas, a qual não poderá exceder 10 (dez) horas diárias e poderá ser realizada aos finais de semana.

• As empresas que desempenham atividades essenciais poderão constituir regime especial de compensação de jornada por meio de banco de horas independentemente da interrupção de suas atividades. Importante destacar que essa medida, assim como as demais, só pode ser aplicada com o reconhecimento do poder executivo federal acerca das condições mencionadas e de ato do Ministério do Trabalho e Previdência, ou então por negociação coletiva.

O ato do Ministério do Trabalho e Previdência necessário para essas medidas poderá suspender a exigibilidade dos recolhimentos do FGTS de até 4 (quatro) competências, relativos aos estabelecimentos dos empregadores situados em municípios alcançados por estado de calamidade pública reconhecido pelo Poder Executivo federal. Os empregadores poderão fazer uso da prerrogativa independentemente:

• Do número de empregados; Do regime de tributação;

• Da natureza jurídica; Do ramo de atividade econômica; e

• Da adesão prévia

B) QUAIS SÃO AS ORIENTAÇÕES DA PROCURADORIA REGIONAL DO TRABALHO DA 4ª REGIÃO (MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO), DESTINADAS AOS EMPREGADORES. NA RECOMENDAÇÃO Nº 02/2024?

1. Abster-se de adotar medida de suspensão temporária do contrato de trabalho, compreendida essa como a cessação temporária da prestação de serviços e da obrigação de pagamento dos salários, salvo como parte integrante de Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda, na hipótese de instituição pelo Governo Federal, na forma da Lei 14.437/2022;

2. Garantir que as ausências ao trabalho devidamente justificadas pela exposição direta a alagamentos, enchentes e outras situações de força maior ocasionadas pela calamidade pública sejam devidamente abonadas ou adotadas as medidas trabalhistas alternativas previstas no item 1 supra.

3. Estabelecer política de flexibilidade de jornada enquanto os serviços de transporte, creches, escolas, dentre outros, não estiverem em funcionamento regular, especialmente quando tais situações impactarem a prestação de serviços.

4. Adotar política de gestão clara para a situação emergencial, sobretudo quanto aos casos de impossibilidade justificada de comparecimento ao trabalho, e a comunicação expressa aos interessados;

5. Privilegiar o diálogo social prévio na implantação de medidas de impacto aos trabalhadores e medidas trabalhistas alternativas, para viabilizar a adequação aos diversos setores de atividade econômica, localidades e peculiaridades regionais.

6. Assegurar que nas hipóteses de invocação da força maior, por ser situação excepcional e que implica redução de direitos, sejam observados os estritos requisitos previstos nos art. 501 a 504 da CLT, evitando sua aplicação abusiva

Importante sempre consultar a área trabalhista do escritório para verificar a viabilidade de aplicação ao seu cenário concreto de cada uma dessas medidas para evitar futuros riscos tanto em autuações dos órgãos de fiscalização como em ações individuais.

Principalmente porque a aplicação da referida lei se dá com o reconhecimento do poder executivo federal acerca das condições mencionadas e de ato do Ministério do Trabalho e Previdência, o que estimamos que deve ocorrer logo, ou através de negociação coletiva com o respectivo sindicato.

Então é fundamental analisar caso a caso, até porque diversos sindicatos já estão validando convenções e acordos permitindo tais medidas.

A Equipe Trabalhista da EK Advogados coloca-se à disposição para quaisquer dúvidas ou esclarecimentos.

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